domingo, 14 de junho de 2009

O caminho do sucesso em treze teses

Walter Benjamin escreveu as tais tecnicas na década de trinta. Perifericamente, ele tinha mania das listas e do número treze, porque além dessas, temos: A técnica do escritor em treze teses, Treze teses contra esnobes, A técnica do crítico em treze teses, No.13 (“Treze – senti um prazer cruel em me deter nesse número”, Marcel Proust), e por aí vai.
Naturalmente, o percurso é pautado por aqueles valores indeléveis da arte e da escrita que o mercado e a pós-modernidade mandaram para o diabo, mas a julgar por quanto Benjamin é neuroticamente citado e cultuado em todo maldito curso de pós-graduação, então os seus (dele) valores ainda devem valer alguma coisa, a menos que não, quer dizer, que a hipocrisia para com o autor e seu conteúdo seja agora a norma de toda citação. Lá vão elas:
1 – “Não existe nenhum grande sucesso a que não correspondam esforços reais. Mas seria um erro admitir que esses esforços sejam sua base. Os esforços são sua conseqüência. Conseqüência da elevada auto-estima e disposição para o trabalho daquele que se vê reconhecido. Por conseguinte, uma grande exigência, uma hábil réplica e uma feliz transação são os verdadeiros esforços subjacentes aos verdadeiros sucessos.”;

2 – “Satisfação dada por meio da remuneração paralisa o sucesso, satisfação dada por meio do esforço o aumenta. Salário e esforço estão nos pratos de uma balança: todo o peso do amor-próprio deve cair no prato do esforço, assim o prato do pagamento vai sempre subir rapidamente”;

3 – “Só podem ter sucesso por muito tempo aqueles que em sua conduta são guiados por motivos transparentes. A massa destroça qualquer sucesso tão logo este lhe pareça opaco, sem valor instrutivo ou exemplar. É evidente que esse sucesso não precisa ser transparente no sentido intelectual. Qualquer teocracia demonstra isso. Ele apenas deve se ajustar a uma idéia, ou melhor, a uma imagem, logo, ao padre o confessionário, ao general a condecoração, ao financista o palácio. Quem não paga seu tributo ao tesouro de símbolos da massa deve fracassar.”;

4 – “Quanto mais claro, inequívoco, evidente, maior o afeto do público; maior é o raio de ação de uma manifestação intelectual, tanto mais público aflui para ela. Desperta-se “interesse” por um autor, isso quer dizer: começa-se a procurar sua fórmula e a expressão mais primitiva desta”;

5 – “A referência à posteridade foi uma maneira de exercer pressão no sentido de consolidar a posição do escritor na sociedade. Todas as épocas anteriores são unânimes na convicção de que os contemporâneos guardam as chaves que abrem as portas da fama póstuma. E hoje isso é tanto mais válido – por ser menor a vontade e o tempo que cada geração emergente pode ter para processos de revisão.”;

6 – “Fama, ou melhor, sucesso, tornou-se obrigatório e já não significa hoje ‘superação,’como antes. Numa época em que qualquer escrivinhação miserável se divulga em milhares de exemplares, resulta simplesmente um estado de agregação da literatura.”;

7 – “Condição da vitória: alegria pelo sucesso exterior como tal, alegria pura, desinteressada, que melhor se manifesta no fato de que alguém tenha prazer no sucesso - mesmo se for de um outro e precisamente se for imerecido. Um senso de justiça farisaico é um dos maiores obstáculos para o progresso.”;

8 – “Muita coisa é inata, mas muito é feito pelo treinamento. Ninguém será bem-sucedido se se poupar, se só mergulhar fundo nos temas maiores e se não estiver em condições de se empenhar até o extremo por causas insignificantes.”;

9 – “Em toda prova, as maiores chances não estão com o candidato mais bem preparado, mas com o improvisador. Pela mesma razão, quase sempre são as questões secundárias, as coisas de menor importância que decidem. O inquiridor que temos à nossa frente exige, antes de tudo, que o enganemos acerca de sua função. Se conseguimos isso, então ele nos fica agradecido e pronto a perdoar muita coisa”;

10 – “Um gênio qualquer mora dentro de todo bem-sucedido. Também o sucesso é um encontro marcado: encontra-se no lugar certo, na hora certa. Isso significa: compreender a língua na qual a sorte faz seu acordo conosco. Como é que alguém que nunca ouviu essa língua pode julgar a genialidade do coroado de êxito? Para ele tudo é por conta do acaso. Não lhe ocorre que aquilo que assim denomina é, na gramática da sorte, o mesmo que, na nossa, o verbo irregular, ou seja, o rastro não apagado duma força primitiva.”;

11 – “A estrutura de todo sucesso é, no fundo, a estrutura do acaso.”;

12 – “Pode-se blefar, mas nunca se deve sentir como um blefador. É fundamental ter consigo aquela boa-fé que nunca falta aos mais astutos impostores, mas quase sempre aos pobres-diabos.”;

13 – “O fato de que o segredo do sucesso não mora no espírito é revelado pela expressão ‘presença de espírito’. Assim, não é o Quê nem o Como, mas só o Onde do espírito que determina. Que ele esteja presente no momento e no espaço, penetrando o tom de voz, o sorriso, o olhar, o gesto. Pois, presença de espírito só o corpo é que cria!”;

Eis aí, o bom e velho Walter Benjamin: paradoxal, brilhante, essencial. De corpo e alma.
________________________________________[1] Walter Benjamin. “O caminho do sucesso em treze teses” in Rua de Mão Única – Obras Escolhidas II. São Paulo, Brasiliense, 1987.
*A escritora paulistana Márcia Denser publicou, entre outros, Tango Fantasma (1977), O Animal dos Motéis (1981), Exercícios para o pecado (1984), Diana caçadora (1986), Toda Prosa (2002) e Caim (2006). Participou de várias antologias importantes no Brasil e no exterior. Organizou três delas - uma das quais, Contos eróticos femininos, editada na Alemanha. Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, é pesquisadora de literatura brasileira contemporânea, jornalista e publicitária.

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