A primeira eleição direta para presidente da República desde o golpe militar de 1964 completa 20 anos neste domingo. Nestas duas décadas, o Brasil mudou junto com os 22 personagens que tentaram se eleger no dia 15 de novembro de 1989. Alguns morreram, outros desapareceram do noticiário, enquanto alguns fizeram tudo diferente do que prometeram fazer naquele ano em que o grande vencedor foi Fernando Collor de Melo.
Até o dia em que Collor foi empossado presidente da República, muita história aconteceu naquela que foi uma das mais curiosas eleições ocorridas no Brasil. Foi naquele ano, por exemplo, que o empresário Silvio Santos tentou se filiar ao então PFL (hoje DEM) para tentar entrar na disputa. Como não conseguiu, ingressou no minúsculo PMB, mas o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) impugnou sua candidatura depois de encontrar irregularidades na legenda.
Sem o apresentador no páreo, o debate se concentrou no ex-metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em Ulysses Guimarães (PMDB) - símbolo da campanha pelas eleições diretas -, Leonel Brizola (PDT) e em Collor, o político que emergia junto com o desconhecido PRN.
A festa do presidente durou pouco. Ele já estava de malas prontas em 1992 após enfrentar um processo de impeachment e renunciar ao cargo por suspeita de corrupção. Depois de alguns anos longe dos holofotes, ele se elegeu senador por Alagoas em 2006 e hoje faz parte da base de apoio do atual presidente, o mesmo Lula vencido naquela eleição.
A ironia desse apoio é que, naquela época, um pregava exatamente o oposto do outro. Enquanto Lula aparecia carrancudo no programa eleitoral gratuito cuspindo maribondos contra o FMI (Fundo Monetário Internacional), Collor era a personificação do que se chamava na época de neoliberalismo, o nome dado à teoria que defende um Estado decidindo cada vez menos que a iniciativa privada.
Além da discordância ideológica, Lula e Collor protagonizaram no segundo turno um dos episódios mais polêmicos da história eleitoral brasileira. Foi quando o candidato do PRN mostrou uma entrevista com a ex-namorada de Lula, Mirian Cordeiro, acusando o atual presidente de incentivar o aborto de sua filha.
Lula ficou pelo caminho nessa e em mais duas eleições, até que, em 2002, aconteceu o que parecia impossível: ao mudar de discurso, de aparência e de aliados, Lula venceu o pleito e se reelegeu em 2006. Hoje, elogia e posa ao lado de Collor, seu ferrenho defensor.
Outra ironia é o que aconteceu a outro personagem, o então presidente José Sarney (PMDB), odiado tanto por Lula quanto por Collor à época . Vinte anos depois e três vezes presidente do Senado, Sarney, ao lado de Collor, faz parte da tropa de elite que blinda Lula em momentos de crise.
Mas havia outros personagens de peso naquelas eleições. Um deles era Brizola, um político das antigas. Morto em 2004, ele ficou em terceiro lugar e apoiou Lula no segundo turno. Em 1998, foi candidato a vice do petista. Hoje, seu partido também apóia o PT e é dono de um ministério, o do Trabalho, comandado por Carlos Lupi.
Mais candidatos também fizeram história naquela ano. Mário Covas (PSDB), quarto colocado, acabou eleito governador de São Paulo em 1994 e reeleito em 1998. Ele era o virtual candidato tucano à Presidência em 2002, mas acabou morrendo em 2001 vítima de câncer.
Rival histórico de Covas, o hoje deputado federal Paulo Maluf (PP-SP) ficou em quinto lugar naquela eleição, à frente de Guilherme Afif Domingos (DEM) – hoje secretário do governador de São Paulo, José Serra (PSDB). Amargando uma sétima colocação mesmo com o maior tempo de televisão no programa eleitoral gratuito, Ulysses Guimarães (PMDB) não transformou sua imensa popularidade em votos. Ele morreu em 1992 em um acidente de helicóptero em Angra dos Reis (Rio de janeiro). Seu corpo nunca foi encontrado.
Os hoje deputados federais Fernando Gabeira (PV) e Ronaldo Caiado (DEM) tiveram votação inexpressiva naquela eleição, ficando em 18º e 10º lugares, respectivamente. Mais fortes hoje, eles são os lideres de suas bancadas na Câmara dos Deputados.
Roberto Freire foi outro político que pouca gente lembra ter disputado a Presidência em 1989. Ele ficou em oitavo lugar, mas hoje é o presidente nacional do PPS e o primeiro suplente do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB–PE). Ele faz oposição ao presidente Lula e já declarou apoio ao PSDB nas eleições presidenciais de 2010.
Com tantos candidatos, era natural que alguns ficassem para a história como personagens folclóricos. Esse é o caso do médico Enéas Carneiro, morto em janeiro de 2007 vitimado por um câncer. Barbudo e usando óculos enormes, ele ficou nacionalmente conhecido pelo bordão “meu nome é Enéias!”, gritado sempre ao final dos 17 segundos que ele tinha no horário eleitoral gratuito. Em 2002, foi eleito deputado federal eleito com a maior votação do Brasil.
Outro que chamou a atenção foi José Alcides Marronzinho de Oliveira, que aparecia amordaçado na tela. Quando ele decidiu falar, afirmou que obrigaria a Petrobras a procurar água no Nordeste. Ficou em 13º lugar. Hoje, ele é evangélico, mudou de nome para Jamo Little Brown e cuida de um jornal online.
Outros candidatos daquela época morreram, como Paulo Gontijo – 14º colocado –, em 2002, e Antônio Aureliano Chaves de Mendonça, que foi vice-presidente da República (1979-1985), mas só conseguiu 0,9% dos votos nas eleições de 1989. Apoiou a candidatura Lula em 2002 e morreu em abril de 2005 filiado ao PSDB. Outros candidatos simplesmente desapareceram do noticiário, como Zamir José Teixeira, Manoel Antônio de Oliveira Horta e Lívia Maria Lêdo Pio de Abreu, a primeira candidata a presidente do Brasil.
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